Não são poucas as igrejas evangélicas e os evangélicos que têm demonstrado apoio irrestrito ou silêncio conivente com o governo bolsonarista. Até aí, estaria tudo bem, porque, gostemos ou não, são escolhas.
Como o campo evangélico é extremamente diverso, é comum a alegação de que evangélicos possuem posicionamentos diferentes e podem sustentar suas posições na Bíblia, porque isso seria uma questão de interpretação. Mas, definitivamente, não se trata de interpretação. A vida de Jesus está lá, nos quatro Evangelhos do Novo testamento para servir de referência.
A posição desses pastores — seus impérios, sua conivência com a política bem-sucedida de indiferença com os cuidados da população — é uma traição inquestionável do que é a vida de Jesus descrita nos quatro Evangelhos.
Homens como Silas Malafaia, Edir Macedo, Valdemiro Santiago e R.R. Soares não possuem qualquer compromisso com uma "forma" de ser evangélico. São interesseiros milionários. É inexplicável que líderes milionários se digam imitadores de alguém que mal tinha uma casa e fomentou que os ricos distribuíssem a riqueza que tinham.
Chega a ser doentio que esses pastores busquem conquistar o país com uma megaigreja em cada parte do território nacional, enquanto, na Bíblia, Jesus não teve qualquer apego aos templos por onde passou.
Aliás, as principais memórias sobre Jesus, os textos mais conhecidos sobre suas mensagens (o Sermão da Montanha talvez seja o maior deles) aconteceram em meio ao povo, na rua, nos montes, às margens de rios, e nunca no templo. É sintomático que, nas poucas ocasiões em que Jesus aparece no templo, ele tenha precisado fugir da elite religiosa, ameaçado de morte.
Isso não quer dizer que igrejas são desnecessárias, quer dizer que igrejas têm mais a ver com uma relação comunitária, cuidada por sua liderança, do que com um império de centenas de igrejas espalhadas pelo país e que torna o seu pastor-fundador absurdamente rico, milionário.
O império desses homens também criou uma geração de pastores "playboys" que ostentam preconceito, racismo religioso e homofobia. Pastores como André Valadão e Lucinho Barreto não são apenas pregadores ruins, são cínicos e desrespeitosos.
Como a pregação no púlpito de uma igreja também é algo que se aprende a fazer (as frases, as orações, as músicas, os gestos, o tom de voz, tudo pode ser ensinado e aprendido) eles apenas interpretam, cada um à sua maneira.
Lucinho Barreto é o homem que age como menino, brincando de "cheirar a Bíblia", incitando racismo religioso, gabando-se de atacar terreiros. Que diz que, contra bandido, o policial deve matar "descarregando a arma e jogar o revólver na cara no final".
Da mesma forma faz André Valadão, o menino rico que ostenta a boa vida em Orlando, nos Estados Unidos, enquanto acha estar defendendo a Bíblia ao dizer que "igreja não é lugar para gays".
Igreja Batista Lagoinha, Vitória em Cristo, Universal, Renascer, Sara Nossa Terra, Catedral do Avivamento, de Marco Feliciano, Igreja Batista Atitude, entre outras e suas respectivas lideranças não possuem nada, absolutamente nada, do que a vida de Jesus é. Consequentemente, elas ferem e traem quem deposita nelas a credibilidade de conhecimento e compromisso com o Evangelho.
Mas nem tudo vem do mundo pentecostal e seus pastores milionários, seus playboys inconsequentes. Não mesmo. A precariedade e perversidade políticas do governo Jair Bolsonaro (sem partido) também têm a chancela dos que fingem "racionalidade" e imparcialidade.
Órgãos como Convenção Batista Brasileira, Coalizão pelo Evangelho, Visão Nacional para a Consciência Cristã, Associação Nacional dos Juristas Evangélicos, Jocum (Jovens com uma Missão), entre outros, contribuem para blindar um governo que tem na violência sua principal linguagem, prioriza mais as armas do que as vacinas e continua atacando minorias sociais (e a democracia).
E, como o governo odeia tudo que tem aparência de "esquerda", "comunista" ou "progressista", esses homens (sempre homens) "ilustrados" da igreja usam o silêncio para chancelar tudo que o bolsonarismo tem raivosamente implementado, da política econômica à social.
Não há inspiração em Jesus possível aqui. Um país com um governo que patina no cuidado da saúde numa das maiores crises sanitárias de nossa história, com a economia secundarizada para os mais pobres, implorando por um auxílio emergencial para não tocar a fome, e o campo evangélico conservador e fundamentalista dividido entre os que olham ensimesmados para o céu e os que olham para suas contas bancárias e para os privilégios da sua igreja.
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