Há dez anos, usamos a camiseta acima no que seria o primeiro protesto pacífico do MEEB (Movimento pela Ética Evangélica Brasileira). Isso porque o (im)Pastor Silas Malafaia lançou um anúncio enigmático: no programa do sábado seguinte levaria o “profeta de deus” Morris Cerullo, que por sua vez daria uma palavra poderosa.
E assim foi. Ligados na telinha, ouvimos cerca de 40 minutos de pregação e profecia misturada com numerologia de quintal (coisas tipo 2009 termina com 9, que é o número da prosperidade). Havia várias admoestações para que se confiasse cegamente no “profeta”, afinal desconfiar seria “pecado de rebeldia”, Para os que obedecessem totalmente ao “profeta” estaria reservada a “unção financeira dos últimos dias”, o derramar das riquezas dos ímpios em favor dos fiéis, afinal uma grande crise se avizinhava e “deus” queria prosperar o seu povo (contanto que se fizesse o que o “profeta” lhe ordenava).
Após uns 30 minutos de “lavagem cerebral gospel”, finalmente a facada: para receber a tal “unção financeira”, o fiel precisaria desembolsar 900 reais e depositar a quantia nas contas da Associação Vitória em Cristo de Silas Malafaia. Como brinde, o fiel receberia inteiramente “grátis” a Bíblia de Batalha Espiritual e Vitória Financeira, de autoria de Morris Cerullo.
Abaixo, 5 minutinhos da tal pregação para se ter uma ideia do tamanho do engano:
Enfim, após assistirmos ao tal programa (que foi reprisado várias vezes para tentar abarcar o maior número possível de incautos) ficamos na tal ira santa. Afinal, havíamos acabado de assistir a seres inescrupulosos usando do Santo Nome do Senhor para arrecadar dinheiro. E sabíamos que 2 meses depois aconteceria a Expo Cristã, uma feira de negócios gospel. Então decidimos ir, mas vestindo uma camiseta que externasse nossa indignação. Era a tal camiseta do início deste artigo. E mais uns meses, e houve nossa primeira participação, com faixas e camisetas, na Marcha para Jesus em São Paulo.
Essa breve introdução foi necessária para situarmos o clima “gospel” em 2009. Nessa época já havia alguns que se autointitulavam “Apóstolos”, como o próprio dono da Marcha, o Apóstolo (?) Estevam Hernandes da Igreja Apostólica Renascer em Cristo; Edir Macedo já tinha grande fortuna e já havia divisões em sua denominação (como as que levaram à fundação das igrejas do R. R. Soares e do Valdemiro Santiago); o Apóstolo (?) Agenor Duque tinha recém criado sua igreja Plenitude do Trono de Deus, e seguia pelo mesmo caminho; o movimento G12, embora mais fraco, ainda existia e tinha suas imitações, como o MIR12 do Apóstolo (como essa modinha se prolifera!) Renê Terra Nova e o MDA; igrejas pentecostais como algumas Assembleias de Deus buscam se modernizar para arregimentar novos membros; os shows gospel passam a ser uma alternativa para atrair os jovens através de uma forma de entretenimento “saudável”; muitas igrejas passam a entender que crescimento numérico e aumento na arrecadação são sinônimos de salvação de vidas – a transformação do caráter passa a não ter tanta importância, conquanto que o fiel esteja assiduamente nos cultos e seja generoso nos dízimos e ofertas; para facilitar a aquisição de benesses, as grandes igrejas passam a indicar políticos a seus fiéis, além de buscar adquirir canais de TV e rádio, ou pelo menos manter uma programação diária ou semanal nessas mídias.
A “unção financeira dos últimos dias” de Malafaia e Cerullo foi apenas o pavio que levou o MEEB a realizar manifestações pacíficas em vários eventos gospel Brasil afora, porém aberrações iguais ou até piores continuaram a ocorrer nos meios evangélicos. Cerullo voltou ao programa do Malafaia outras tantas vezes, intercalando com o Dr. Mike Murdock. Ambos, Murdock e Cerullo apresentavam sempre a mesma fórmula: uma unção especial, que seria dada a quem desembolsasse a quantia exigida pelo grupo, do qual Malafaia fazia parte e era o principal beneficiário (já que as doações iam, pelo menos em tese, para o bolso de suas instituições). Malafaia terminou seu “Projac gospel”, comprou jatinho, ampliou editora, tomou para si a igreja do falecido sogro e construiu dezenas de templos-filiais por todo o Brasil. E figurou na Revista Forbes como um dos pastores mais ricos do Brasil (depois entrou em litígio com a revista, pois a riqueza não está em seu nome, mas no nome das instituições das quais é o eterno e único presidente).
De 2009 para cá, vimos o Evangelho ser aviltado de todas as formas. Ele foi vendido, desfigurado, desmentido, envergonhado. Vimos (im)pastores vendendo arcas da aliança, óleos com propriedades mágicas, água ungida, lenço ungido, seguro de vida gospel, consórcio gospel, cartão de crédito da denominação, viagens a Israel com pastor famoso, cruzeiro gospel, unção da riqueza, unção de nobreza, títulos eclesiásticos, até a salvação (sim, certa vez Mike Murdock vendeu a salvação da família do fiel se ele desse R$ 1.000,00 para o programa do Malafaia).
O Evangelho também se espetacularizou ainda mais nesses últimos 10 anos. Os (im)pastores descobriram 2 formas bastante eficientes de simular milagres: o uso de truques baratos de mágica e a hipnose. Com o primeiro método simulam a retirada de caroços, agulhas, gosmas e coisas do tipo que estariam no corpo do fiel e seriam obra de magia negra. Com o segundo método, simulam possessões demoníacas, levam o fiel a se esquecer de fatos negativos da sua vida, o fazem girar, cair, rir, chorar. E a plateia, ao ver tudo isso, encantados com o poder do (im)pastor, não titubeiam quando chamados a colocar o dinheiro na sacolinha (os mais modernos usam maquininhas de cartão).
E o Evangelho se irmanou com o Mundo. Nesses dez anos, recrudesceram os laços entre as igrejas e os governos. Ao invés de defender os pobres e os necessitados, as igrejas em boa parte agora defendem a si mesmas, às suas isenções tributárias, aos seus desejos de ter uma concessão de rádio ou TV, às suas necessidades de desburocratizar a construção de grandes templos em locais que, pelas leis então vigentes, não poderiam acontecer.
Nesses dez anos, os grandes líderes evangélicos saíram da obscuridade de seus templos para os holofotes das colunas sociais, das festas da alta sociedade, das homenagens através de seus nomes em placas de rua, das fotos como papagaios de pirata dos políticos mais influentes (mas que precisam dos votos dos fiéis para se manterem no poder). A simplicidade deu lugar aos caríssimos relógios importados e carrões do ano.
Mas tanta iniquidade não passou despercebida.
Nesses 10 anos, pessoas anônimas se levantaram por todo o Brasil estendendo faixas e portando camisetas que buscavam levar à reflexão sobre as essências do Evangelho. O resgate da Verdade gritava através das faixas, das frases e versículos nelas escritas. Olhos foram abertos, outros mais se fecharam com mais força para não ter que abrir mão daquilo que o Mundo lhes oferecia com tanto prazer.
Morris Cerullo e Mick Murdock deixaram de vir ao Brasil a pedido de Malafaia, pois a coisa chegou num ponto em que ninguém mais lhes dava crédito. Mas agora a onda é o Apóstolo (?) Agenor Duque trazer o (im)Pastor Benny Hinn para derrubar os fiéis na base da hipnose coletiva.
Ainda há muito a fazer. Nós só seguramos as faixas, o Senhor é quem faz o trabalho.
Voltemos ao Evangelho puro e simples,
O $how tem que parar!
O $how tem que parar!
A DEUS toda a honra e toda a glória para sempre.
Em tempo: no dia 20 de Junho (feriado católico de Corpus Christi apropriado indevidamente pelos evangélicos) haverá a Marcha para Jesus em São Paulo. Pelo décimo ano seguido estaremos lá, permitindo Deus, portando nossas faixas com versículos bíblicos e exortações. Se você sentir de estar lá conosco nessa inglória tarefa, estaremos a partir das 9 horas no Posto BR na saída do metrô Armênia.
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